"Agora mesmo nós ainda estamos perto do tempo em que a pintura, o som, o movimento pertenciam a categorias separadas e identificáveis e nós falávamos da síntese delas como multimídia... Mas há uma fusão, uma transformação que a "profissão nova" tornou possível: "intermedia" foi a palavra que Dick Higgins usou. Você pode ver isso nesses trabalhos. E eles não deixaram nada para trás."

INTRODUÇÃO Por Helen Thorington
Tradução de Alexandre Venera

Foi a alegria e beleza do trabalho visual e interativo de Nicolas Clauss, a simplicidade e a conveniência do som que Jean-Jacques Birgé criou, e a síntese que foi alcançada, que chamou primeiro minha atenção nos artistas franceses incluídos em Paris Connection.

Eu interagi com os trabalhos de Clauss, ri e me diverti. "Turbulence" focalizou o trabalho de Clauss; falei sobre ele com meus alunos, e depois, como eu vim a saber, do trabalho dos outros membros deste grupo informal de artistas parisienses, falei bem deles também. A reação dos alunos foi similar à minha.

Há uma diferença enorme, um amigo observou recentemente, entre aprender e experimentar. O que você adquire com esses artistas é uma experiência. E isso é fácil. A propósito, isto é um elogio. Em uma mídia onde um trabalho pode facilmente esgotá-lo com complicações, sobrecarregando-o com informação, levando tanto tempo para navegar que você termina, de forma metafórica, pelo menos, puxando seus cabelos de frustração, aqui são trabalhos simples que aproveitam o meio, são tão facilmente acessíveis que alguém pode sentir a presença dos artistas (calma) e o interesse humano deles.

"As coisas simples são freqüentemente bonitas! Não?" (Durieu)

Sim elas são.

Mudando de Clauss para Durieu e "Oeil Complex", não sobrecarregado com o conhecimento dos sólidos platônicos (veja a análise de Andrews sobre "Oeil Complex"), eu encontrei os olhos com uma criatura — alguma coisa com forma incomum mas viva e dando a expressão de sentir talvez desespero, como sugere Durieu, talvez o espanto como eu experimentei.

Eu sou natural. Quero experimentar a arte primeiro, estudá-la depois. Eu senti alguma coisa no contato com essa criatura, da mesma maneira que senti algo (encanto) pelos animais desarticulados no zoo de Durieu, enquanto minhas ações provocaram-lhe tropeços sobre si mesmas, se amarrando em laços, somente para regularizar e recuperar as suas composturas, como criaturas semi-autônomas e independentes, quando finalmente eu as deixei sozinhas.

Ou mudando para o trabalho mais obscuro, mais minimalista de Schmitt, no qual a luta de criaturas em forma de varetas, em “Avec determination” lançam um acorde humano mesmo antes de alguém entender que o trabalho de programação é inseparável do significado do trabalho - que esses seres semi-autônomos aparentemente frágeis mplementados em algoritmos são confinados sempre em ambientes criados para eles e com comportamentos somente possíveis dentro deles. Preso nessa situação desesperada, eles têm a força do que Roberto Simanowski chama uma vida dupla: são criaturas colocadas em caixas e são símbolos, representando o espectador que, momentaneamente no controle, lhes faz bater desesperadamente contra os limites dos ambientes delas com o simples movimento de seu "mouse".

Inclinando mais para o lado musical, há o instrumento visual, interativo e musical de Lamarque, Pianographique — eu não estou segura da importância de solucionar a pergunta se é uma obra de arte ou uma ferramenta. É um dos muito poucos trabalhos interativos e "on-line" verdadeiramente notáveis que combinam música e imagem e com o qual é um prazer brincar. E há o trabalho de servovalve - minimalista, assentado num fundo preto, com suas imagens em movimento e com seus sons, bonito para se para ver e ouvir. Tente acessar www.servovalve.org/2001/0621/0621.html ("ohon"), ou www.servovalve.org/2001/1028/1028.html ("electrotomy"), ou www.servovalve.org/2003/0104/0104.html ("search: ubanizer--11"), que é um trabalho visualmente mais complexo. Não é difícil de se imaginar interagindo com essas transformações controladas por programação, como faz servovalve. Mas também é uma experiência cativante para assistir/escutar, ser arrebatada pelos seus misterios, às vezes agourentos, mas sempre comunicando mundos

"Poesia algorítmica", na expressão de Birgé e Durieu, pode muito bem ser uma descrição boa para todas essas obras, se tomarmos a poesia como um termo abrangente, ao invés de uma divisão da literatura. A matemática e a programação estão a serviço da arte, da síntese, do significado da inteligência humana e da emoção, atualmente inseparável deles. A "nova profissão de programar", como disse Birgé, está bem representada por todos esses artistas.

Nicolas Clauss fala do interesse dele no meio-termo. Há algo de meio-termo em todos esses trabalhos. Algo que me faz lembrar dos romances populares de Ann McCaffrey sobre os cavaleiros de dragão e feiticeiros, que viajam entre universos sem visão e audição, mas, ao mesmo tempo, "sem deixar nada para trás."

Do modo pelo qual nós falamos sobre esses seis artistas alguém pode perceber que estamos num meio-termo. Nós podemos não saber o que a arte será daqui a vinte ou trinta anos, mas podemos estar seguros de que não falaremos sobre isso da mesma maneira, não mais do que falamos agora sobre a atuação da arte em termos da disciplina da qual ela emergiu e desses que contribuíram para o seu desenvolvimento. Agora mesmo ainda estamos perto do tempo da pintura, do som, do movimento que pertence a categorias separadas e identifícáveis, e nós falamos da síntese delas como multimídia. Mas há uma fusão, uma transformação que a "nova profissão" torna possível — "intermedia" foi a palavra que Dick Higgins usou. Você pode ver isso nesses trabalhos. E eles não deixam nada para trás.

INTRODUÇÃO Por Helen Thorington
Tradução de Alexandre Venera
 
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Co-publicado em fevereiro de 2003, Nova Iorque, Rio, Berlim, Toronto